“Temos um processo de desinflação em curso, mas com algumas ameaças”, foi dessa forma que Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil começou sua fala no Lide Brazil Conference London, promovido pelo Lide, UOL e Folha de S.Paulo. Para Campos Neto, o mundo enfrenta um alto nível de endividamento no cenário pós-pandemia. Segundo ele, o processo de desinflação está em andamento, porém, há riscos que ameaçam sua continuidade, como a persistência da inflação nos serviços, apesar da queda no setor de bens.
O que aconteceu
O evento, que começou nesta terça-feira (28), contou com lideranças políticas e empresarias. Além de Campos Neto, participaram, entre outros, o ex-presidente Michel Temer, o ex-governador de São Paulo João Dória, além dos presidentes da Câmara dos Deputados Arthur Lira (que enviou um vídeo) e do Senado Rodrigo Pacheco.
Inflação de serviços se mantém alta e dificulta convergência. Segundo Roberto Campos Neto, a inflação de serviços permanece elevada no cenário mundial, inclusive no Brasil, enquanto a inflação de bens apresenta uma tendência de queda. Ele enfatiza que, para que o processo de desinflação continue, é essencial que a inflação de serviços também comece a diminuir. “A gente precisa que a inflação de serviços comece a cair, porque não tem como a inflação de bens ficar baixa o suficiente para fazer com que o processo siga de convergência sem ter uma melhor inflação de serviços.”
Eleições americanas e economia impulsionam inflação Campos Neto destacou que o cenário político nos Estados Unidos está pautado por três principais pilares econômicos, e todos afetam a inflação: questões fiscais, protecionismo e imigração. “Quando a gente olha um pouco a eleição americana, a gente hoje tem três grandes grupos, vamos dizer assim, de medidas sendo discutidas, tanto pelos republicanos quanto pelos democratas”, disse ele, referindo-se aos aspectos fiscais, à tendência protecionista e às políticas de imigração, que têm consenso entre os partidos e geram impacto inflacionário.
Expansão fiscal é uma das forças inflacionárias no debate americano. O presidente do Banco Central afirmou que tanto republicanos quanto democratas adotaram uma postura mais expansionista em termos de gastos públicos nos últimos anos. “Passaram de um fiscal mais restritivo para um fiscal bem mais expansionista, ou seja, mais gastos,” explicou Campos Neto, indicando que esse aumento nos gastos públicos impulsiona a inflação.
Protecionismo é inflacionário e cresce entre republicanos e democratas. Outro ponto levantado por Campos Neto é o fortalecimento de medidas protecionistas nos Estados Unidos, que ele considera um fator inflacionário.
Políticas migratórias restritivas pressionam a mão de obra americana. A restrição à imigração, segundo ele, é outro fator que eleva a inflação, já que o mercado de trabalho americano permanece apertado.
Demanda energética e transição verde desafiam o equilíbrio inflacionário. Campos Neto também mencionou que a transição verde e o aumento na demanda de energia, impulsionada por centros de dados e inteligência artificial, pressionam o custo energético. “Quando a gente pega hoje a diferença entre demanda e oferta de energia, pensando em tudo que a gente está pensando que vai acontecer nesse processo de inteligência artificial, aumento nos centros de processamento de dados, todos esses data centers que estão sendo construídos, então a gente tem uma demanda grande por energia,” afirmou. Ele ainda alertou que a necessidade de fontes sustentáveis eleva os custos de energia.
China
Desafios econômicos da China refletem impacto global. Roberto Campos Neto destacou a importância das transformações econômicas da China para os países emergentes, apontando que o país asiático enfrenta um cenário de reinvenção. “A China tem hoje um grande desafio, porque é uma economia que precisa se reinventar, ela vem com uma parte de consumo caindo,” afirmou, mencionando que o país busca estimular seu crescimento por meio da exportação.
Aumento de restrições dificulta expansão de setores estratégicos. Com a China investindo em setores considerados estratégicos globalmente, muitos países impõem restrições que dificultam o avanço das exportações chinesas. Campos Neto observou que “os países estão colocando muitas restrições, dado que esse setor é estratégico em grande parte dos países,” o que impacta diretamente o crescimento econômico chinês e interfere no comércio global.
Pandemia e envelhecimento da população
Endividamento global pós-pandemia impõe desafios econômicos aos países emergentes e pobres. Segundo Campos Neto, a pandemia gerou níveis históricos de dívida nos países de alta, média e baixa renda, com gastos governamentais desproporcionais entre eles. “Os países ricos gastaram 22% do PIB na pandemia, os emergentes gastaram 10% e os países mais pobres gastaram 4%,” ressaltou, destacando que os países mais vulneráveis enfrentam dificuldades para financiar suas necessidades atuais, agravadas pelas elevadas taxas de juros globais.
Queda na natalidade impacta economias e exige reformas para o crescimento. O declínio nas taxas de natalidade, com destaque para a China, que registra as menores taxas entre as grandes economias, pressiona os países a reformular suas políticas econômicas para sustentar o crescimento. Campos Neto enfatizou a necessidade de reformas focadas na oferta e produtividade, diante de uma população em envelhecimento.